sexta-feira, 17 de janeiro de 2020

Roger Scruton (1944-2020): In Memoriam

O conservadorismo de Scruton, no entanto – tão intempestivamente límpido para gostos contemporâneos tão inclinados para «yet another bundle of facetious ephemera» –, não deve ser confundido com os espantalhos reaccionários apressadamente amarrotados e amontoados pelos seus estridentes detractores. Conservar não é paralisar: é impedir a deterioração. Ninguém conserva senão aquilo em cuja perpetuação acredita. Conservar é combater a própria morte. Ninguém se dispõe a morrer senão por algo que sobreviva ao seu próprio cadáver. Conservar não é canonizar o passado: conservar é apostar no futuro.

A civilização ocidental parece caminhar em direcção à decadência, ao ocaso, ao abismo, atraída pelo chinfrim dos flautistas niilistas da sua própria etimologia: o Ocidente, confessa o étimo, é a terra onde o sol se põe. Scruton, o ocidental, já se pôs. E, com a sua deposição, também o sol, no Ocidente, se pôs mais um pouco e se pôs mais fundo. Está de facto mais escuro o céu desde 12 de Janeiro de 2020. Mas apesar de, com a descida à terra de Scruton, ter ficado mais escuro na terra onde o sol se põe, a hora, embora triste, não pode ser de desânimo. Porque a luminosa lição de Scruton – «why beauty matters?» – autoriza-nos a imaginar que, no momento em que escureceu na terra onde o sol se põe, o filósofo já saudoso soube respirar fundo, abrir os olhos uma última vez e dizer: «Que belo se põe o sol». (texto de Miguel Granja in “Oficina-Da-Liberdade)