Em Setembro de 1975, Álvaro Fernandes, oficial do COPCON, às ordens de Otelo Saraiva de Carvalho, entregou a Isabel do Carmo e Carlos Antunes, dirigentes do PRP/BR, cerca de 1000 G3, subtraídas ao Depósito de Armamento do Exército Português. Naquela altura, todos os partidos tinham armas, embora nunca oficialmente. A norte, os ataques às sedes do PCP, tinham como resposta tiros de pistola ou metralhadora por parte de quem defendia as sedes. São vários os relatos, à esquerda e à direita, sobre a posse ou intenção de possuir armas. Havia armas em mãos de populares “para a defesa da revolução” ou “da reação”, conforme o lado em que se encontrassem, ainda que a convicção é que haveria mais nos movimentos revolucionários.
O que tornava diferentes estas armas na posse de Isabel do Carmo e Carlos Antunes? Primeiro, tinham sido retiradas de forma clara por um oficial do Exército Português, dependente hierarquicamente de Otelo e entregues a um grupo radical que vivia sob a proteção do Copcon. Segundo, porque foram entregues a um grupo de pessoas que nem sequer se constituíra como partido político e que se recusava a jogar segundo as regras da democracia, sem sequer ter concorrido às eleições de 25 de abril de 1975. Terceiro, porque esse grupo de ativistas tivera origem num grupo terrorista, criado, é certo, antes do 25 de Abril, mas que se tornara um dos movimentos mais radicais no espaço político do PREC e que, como sabemos, teria duas metamorfoses: o PRP/BR, até à prisão dos seus principais dirigentes e operacionais, em junho de 1978, e a segunda, mais radical, que a partir deste movimento se transformou nas sangrentas FP-25 de Abril dirigidas por Otelo, Mouta Liz e Pedro Goulart.
“O socialismo nunca se instaurou em sítio nenhum por eleições. União Soviética, China, Cuba fizeram uma revolução para instaurarem o socialismo. Até porque a burguesia não se deixa derrubar por via pacífica. O socialismo não é, pois, um presente de Natal, é uma conquista pela força” — explicava Isabel do Carmo ao jornal Expresso em maio de 1975.
O governo de Pinheiro de Azevedo tinha a preocupação de restabelecer a disciplina no Exército e de pôr fim às milícias populares existentes tanto a norte como a sul. Em virtude do elevado número de armas não legalizadas nas mãos de civis, o risco de confrontos armados ou da criação de novas milícias populares era demasiado perigoso.
Por outro lado, atendendo às pressões exercidas pela opinião pública, foi exigido a Carlos Antunes e Isabel do Carmo que devolvessem as armas que possuíam. Estes recusaram firmemente e encontraram uma solução criativa. De forma a preservar e defender o paiol de armamento que possuíam — onde se incluíam as mil G3 —, decidiram que o BR deveria passar à clandestinidade, levando consigo todo o material armazenado.
Mas antes, a 15 de outubro, porque a clandestinidade era financeiramente exigente, assaltaram o Banco Totta & Açores em Mira de Aire e o Banco de Angola na Damaia, a 21 do mesmo mês, levando 281 e 4237 contos — o equivalente hoje a mais de 200 mil e 700 mil euros, respetivamente (valores de setembro de 2025). Para onde foi esse dinheiro? Perguntem a Isabel do Carmo, a Gobern Lopes, entre outros.
E quais forma os primeiros atentados das BR agora na clandestinidade? A bomba de gás lacrimogénio na manifestação de apoio a Pinheiro de Azevedo (isto é só fumaça), uma bomba colocada na sede do CDS e o ataque à bomba a 5 esquadras da PSP, em Lisboa.
Se, pelo menos na frente civil, as Brigadas Revolucionárias já tinham assegurada a manutenção de milícias privadas, havia que garantir também a lealdade ideológica dentro do Exército e a submissão deste à revolução socialista. Em finais de agosto, foram criados os SUV – Soldados Unidos Vencerão, com o objetivo de formar células políticas dentro do Exército, garantindo que, no momento certo, pudessem atuar de forma autónoma em relação à hierarquia militar. Ainda que a vida deste movimento tenha sido efémera, algumas manifestações com tropa fardada assustaram muitos dos militares da ala mais moderada.
Durante este período, e através de declarações de ex-operacionais, é possível saber que o PRP/BR chegou a equacionar a execução de Jaime Neves e de Pires Veloso. A ideia surgiu em novembro de 1975, quando, numa reunião do COPCON, Otelo informou que já não poderia apoiar o movimento. Os passos e rotinas de Jaime Neves eram conhecidos. Tudo seria feito através da colocação de um engenho explosivo debaixo do carro de Jaime Neves. Sobre Pires Veloso, foi efetuada uma reunião secreta em Campo de Ourique, com um grau de planeamento semelhante. No entanto, a alteração da situação política que culminou no 25 de novembro acabou por enfraquecer essa intenção e redirecionar os esforços noutro sentido – a criação do grupo terrorista do PRP/BR.
Manuel Castelo Branco



