quarta-feira, 22 de abril de 2009

PRIMEIRO-MINISTRO EM TONS DE AZUL


22 Abril 2009 - 00h30
Freeport: Primeiro-ministro processa Charles Smith
Sócrates fala em tenta tiva de “assassinato político”
José Sócrates revelou ontem que apresentou queixas-crime contra o empresário Charles Smith e todos aqueles que o difamaram e utilizaram o seu nome para obter “vantagens ilegítimas” no âmbito do processo Freeport. Em entrevista à RTP, o primeiro-ministro considerou inclusive que está a ser alvo de uma “tentativa de assassinato político”. Recordou o início do processo, em 2004, quando subiu à liderança do PS, e apontou o dedo a um ex-dirigente do CDS-PP e ao chefe de gabinete do então primeiro-ministro, Pedro Santana Lopes. Em suma, o chefe de Governo declarou: “Sinto-me na pele de um processo kafkaiano” e que é “uma cruz que carrego”.
Sócrates recusou revelar contra quem avançou as queixas-crime, referindo apenas o nome de Charles Smith, arguido no processo Freeport, que citou o seu nome no DVD exibido pela TVI. "Quero saber quem utilizou o meu nome para obter vantagens ilegítimas", disse.
Quanto à Justiça, Sócrates demonstrou plena confiança: "Confio na investigação", repetiu duas vezes, insistindo na legalidade do licenciamento do projecto Freeport em Alcochete. Mais, até assumiu que colocava "as mãos no fogo" pelos seus secretários de Estado da época, responsáveis pelo processo. Contudo, o primeiro-ministro espera que a investigação seja célere e que tudo se esclareça.
Antes de fechar este dossiê, Sócrates apontou o dedo aos jornalistas, em particular à TVI: "Não vêem o telejornal de sexta-feira à noite na TVI [conduzido por Manuela Moura Guedes]? É uma caça ao homem, é um telejornal travestido. É um espaço político feito de ódio e ataque pessoal." O chefe do Governo assegurou, porém, que não avançou com processos contra jornalistas, mas "contra pessoas que me difamaram, que por acaso são jornalistas".
Questionado sobre se o caso Freeport poderá custar-lhe a maioria absoluta, Sócrates respondeu: "Duvido. Não tenho jeito para ser vítima. Não me vencem desta forma"
Em termos institucionais, o chefe do Executivo procurou evitar o confronto directo com o Presidente da República, assegurou que a frase que proferiu no sábado contra recados políticos não visava o Chefe de Estado, mas a Oposição. Antes, salientou: "Tenho a certeza de que o sr. Presidente da República não se vai deixar instrumentalizar pela Oposição."
Reconhecendo as divergências entre ambos, remeteu a relação institucional para o que está previsto na Constituição.
APOIO A 65 MIL
O Governo vai aumentar o tecto do subsídio social de desemprego de 330 euros para 450 euros e abranger desta forma mais 15 mil pessoas.No conjunto de medidas de apoio,o Executivo já tinha alargado este subsídio por mais seis meses, abrangendo 50 mil pessoas.
AS FRASES DA ENTREVISTA
"Duvido que o caso Freeport me custe a maioria absoluta. Este processo é uma cruz, mas não me vencem desta forma."
"Não posso assistir a esta tentativa de assassinato político [no chamado caso Freeport] sem dizer nada."
"Qualquer referência ao meu nome neste processo é um insulto, uma difamação e agirei contra essas pessoas."
"Não tive participação directa, mas asseguro que o processo [licenciamento] cumpriu todos os aspectos legais."
"Se a Oposição pensa que vai transformar o Presidente no seu rosto, está condenada ao fracasso."
REACÇÕES
"Não se ouviu uma ideia mobilizadora": Aguiar-branco, PSD
"Não obstante a grave crise que o País atravessa, [Sócrates] mantém os níveis de ilusão, arrogância e ensaia agora uma falsa vitimização. Não se ouviu uma ideia mobilizadora ou que crie uma nova esperança"
"Não quis fazer campanha com base no caso": Paulo Portas, Líder CDS-PP
"Não ouvimos uma palavra sobre Segurança. Quanto à referência a esse elemento no caso Freeport [Zeferino Boal, ex-militante do CDS], houve um distanciamento, porque não quis fazer campanha política com base no caso Freeport"
"Aproveitou entrevista para vitimização": António Filipe, Deputado PCP
"Não se vislumbrou, nesta entrevista, qualquer proposta para Portugal procurar superar a crise. (...) [O primeiro-ministro] aproveitou a entrevista para se fazer de vítima no caso Freeport. É uma vitimização."
"Faltam medidas concretas contra a crise ": João Semedo, Deputado BE
"Foi mais do mesmo, onde se nota a falta de medidas concretas para responder à crise. Aliás, a responsabilidade é toda da crise e não do Governo. O primeiro-ministro também não deve tentar condicionar a agenda da oposição."
PRIMEIRO-MINISTRO EM TONS DE AZUL
José Sócrates foi de fato azul e gravata azul-petróleo, a mesa era azul e até o copo de água do primeiro-ministro era azul. Uma grande coincidência em mais uma entrevista do primeiro-ministro à RTP. Seja como for, José Sócrates estava bem enquadrado no cenário, com fotos de Lisboa à noite nas costas. A maldade da RTP foi outra. Numa altura em que as relações entre o Governo e o Presidente da República andam pelas ruas da amargura, a televisão pública decidiu fazer a entrevista no novo centro de produção, que foi inaugurado no dia 7 de Março de 2007 exactamente por Cavaco Silva. Não é natural que o primeiro-ministro tenha reparado nesse pormenor quando a sua comitiva chegou vinte e dois minutos depois das 29h00 às instalações da RTP. Uma comitiva de três automóveis, com seguranças e um assessor de Imprensa. Minutos antes já tinham chegado duas viaturas, com seguranças e o fotógrafo oficial de São Bento. Tudo muito agitado, muito nervoso, com contactos permanentes para ver quando chegava o convidado. À espera de José Sócrates apenas dois administradores da televisão do Estado. Guilherme Costa, o presidente, era um deles. Sempre muito bem-disposto, particularmente quando uma jornalista da casa perguntou a Sócrates se ia esclarecer alguma coisa do caso Freeport. O outro era Luís Marinho, jornalista, vogal da Administração.
UMA SEGURANÇA MESMO À BEIRA
Discretos, como convém, mas muito atentos e preocupados. Assim estavam os seguranças do primeiro-ministro minutos antes de José Sócrates chegar à RTP. As ordens eram muito rigorosas. Ninguém poderia estar na rua quando o primeiro-ministro chegasse. Mesmo os mais distraídos, que não queriam estar dentro das instalações, atrás de um cordão mais ou menos sanitário, foram conduzidos diplomaticamente para dentro. É que nestes tempos de crise, com a economia sem eira nem beira, o melhor mesmo é prevenir. in
Correio da Manhã