segunda-feira, 21 de setembro de 2020

aleluia!

Leonard Norman Cohen

(Westmount, 21 de setembro de 1934 — Los Angeles, 7 de novembro de 2016)

sexta-feira, 18 de setembro de 2020

Um elogio funebre: 17 de Setembro de 2020. Como se fez um dos piores dias na vida política de Costa


Na sua longa vida política de mais de 40 anos, António Costa, de 59, já viveu dias bastante complicados - para não dizer profundamente dolorosos. 

Ninguém esquece - começando pelo próprio - aquele 17 de Junho de 2017, quando um incêndio em Pedrógão, que alastrou a vários concelhos vizinhos, matou 65 pessoas, a maior parte das quais (47) apanhadas dentro de carros a fugir na Estrada Nacional 236.

Ou depois, no mesmo ano, na madrugada de 16 de Outubro, o drama de ver a tragédia de Pedrógão a repetir-se ponto por ponto - incêndios ciclópicos e caos na Protecção Civil - com 45 pessoas a morrerem vítimas de dezenas de incêndios em 27 concelhos da região centro (sobretudo os distritos de Viseu, Guarda, Castelo Branco, Aveiro e Leiria)

Costa também não se esquece daquele 22 de Maio de 2003, uma quinta-feira, em que um jovem juiz de instrução, Rui Teixeira, foi ao Parlamento para interrogar, e depois prender preventivamente, um deputado do PS, sob a horrorosa suspeita de pedofilia - coisa nunca vista na democracia e incomparavelmente pior do que uma suspeita de corrupção ou outra do género. 

Na altura líder parlamentar do PS, Costa já há dias que sabia que a tempestade vinha a caminho e tentou por todos os meios, junto dos seus amigos do sector da justiça, livrar Pedroso da prisão - mas em vão. (Pedroso esteve preso preventivamente durante quatro meses e depois foi libertado. Nunca foi acusado de nada.) 

Igualmente inesquecível, no pior sentido, foi aquele 9 de Junho de 2004, uma quarta-feira, quando, sendo número dois na lista do PS ao Parlamento Europeu, viu o número um da lista, António Sousa Franco, morrer vítima de ataque cardíaco, depois de uma muitíssimo agitada acção de campanha na lota de Matosinhos, onde o cabeça-de-lista serviu de arma de arremesso numa guerra de facções que estalara no PS-Porto. 

A longa vida política de Costa já incluiu dias muito difíceis - para não falar dos de derrota eleitoral, como a de 5 de Junho de 2011, face à coligação PSD-CDS liderada por Pedro Passos Coelho. E ontem, quinta-feira, foi mais um deles, um daqueles que o PM nunca esquecerá. 
Não ligar aos avisos 

Ignorando conselhos amigos, Costa aceitou, mais uma vez - como já fizera em 2016, sendo portanto já chefe do governo - integrar a comissão de honra de mais uma recandidatura de Luís Filipe Vieira à presidência do Benfica. A notícia, avançada pelo Expresso no sábado passado, transformou-o num saco de pancada durante toda a semana. 

Na cúpula do PS e do governo foram bem percebidos os sinais de ruptura na confiança do país no PM por causa desta decisão - só faltando agora saber se os efeitos serão de curto, médio ou longo prazo. Para isso contribuíram muito as críticas que ouviu do Presidente da República. 

Mas - mais uma vez ignorando conselhos de quem o rodeia - Costa insistiu em manter-se na comissão de honra, agarrando-se à palavra que dera a Vieira. Só que este decidiu "demitir" o PM da comissão de honra. A notícia soube-se nesta quinta-feira já perto das 14.00. Num comunicado, o presidente do Benfica anunciou: "Agradecendo a todos a disponibilidade manifestada, tomei a iniciativa de retirar da minha comissão de honra todos - todos - os titulares de cargos públicos, sejam autarcas, deputados ou membros do governo." 

A notícia caiu como uma bomba. Num comentário nas redes sociais, o comentador político do DN Pedro Marques Lopes - adepto, note-se, do FC Porto - sintetizou o tom geral das críticas: "A triste figura que Costa fez em aceitar estar na comissão de honra de Vieira só é excedida pela tristíssima de ser corrido pelo presidente do Benfica." 
O dano atingiu a própria base política de apoio ao primeiro-ministro. Francisco Seixas da Costa, embaixador aposentado próximo do PS (foi secretário de Estado dos Assuntos Europeus no tempo de Guterres), verbalizou, também nas redes sociais, a sua perplexidade. 

Algures durante a semana, para tentar atirar o "VieiraGate" para segundo plano mediático, Costa acelerou uma remodelação governamental de cinco secretários de Estado que já vinha a planear há algum tempo. 

A pedido expresso da ministra da Saúde, a remodelação incluiu a (até ontem) secretária de Estado adjunta e da Saúde, Jamila Madeira - ex-líder da JS e um nome de peso no aparelho do PS (no Algarve). As duas nunca se deram bem - e Temido foi cavalgando o facto de Jamila ter chegado ao ministério sem experiência no setor. 

Quem conhece bem Jamila Madeira já antecipava na quarta-feira que a ex-líder da JS, tendo saído contrariada, não se deixaria ficar. E assim foi. Numa declaração à Lusa pelas 13.30 - pouco antes, portanto, do comunicado de Vieira -, Jamila - agora de regresso ao Parlamento, confirmava que tinha sido empurrada borda fora. 

"Não pedi para sair e naturalmente fiquei muito surpreendida com a opção da senhora ministra da Saúde [Marta Temido]. Mas saio de consciência tranquila de missão cumprida com a certeza de que fiz tudo o que estava ao meu alcance num ano particularmente inédito", escreveu a (agora de novo) deputada. 

"Após este quase um ano de mandato nas funções de secretária de Estado adjunta e da Saúde, gostava de dizer que é com orgulho que saio num momento em que podemos dizer que terminou o mito de o SNS ser um buraco sem fundo." 

Jamila, porém, não se ficou por aqui. Foi à cerimónia a Belém onde se concretizou a sua substituição (pelo seu camarada de partido António Lacerda Sales, que agora passou de número 3 do Ministério da Saúde para n.º 2) e à saída fez uma declaração aos jornalistas - sem responder a perguntas - onde puxou para si os galões de um suposto saneamento financeiro do SNS.

"Após este 
quase um ano de mandato nas funções de secretária de Estado adjunta e da Saúde, gostava de dizer que é com orgulho que saio num momento em que podemos dizer que terminou o mito de o SNS ser um buraco sem fundo", afirmou. 

Acrescentando que, "pela primeira vez", a meio de Setembro, "os números da conta do SNS demonstram a sua sustentabilidade [financeira], algo tão importante para os portugueses".

"Esse resultado só é possível com o investimento colocado pelo governo liderado pelo primeiro-ministro [António Costa] e com uma gestão criteriosa que foi desenvolvida durante este mandato", concluiu. Deixando, pelo meio, um aviso: "Volto para a Assembleia da República. O meu papel na vida política e partidária continua." 

Pandemia a crescer

O pior de tudo, porém, para este verdadeiro dia horribilis do primeiro-ministro, foram os números da pandemia.

Foi o pior registo desde 10 de abril (quando o país estava todo em quarentena e subordinado às regras apertadas do estado de emergência): 770 novos infectados e mais dez mortos (passando assim o número de vítimas mortais para 1888). 

A possibilidade de já se estar verdadeiramente numa segunda vaga - que assola outros países europeus - levou o gabinete do PM a anunciar, pelas 17.15, a convocação de emergência para esta sexta-feira de uma reunião do gabinete de crise do governo que trata das questões da pandemia. 

Uma fonte do gabinete do PM disse à Lusa que a reunião, que se iniciará às 11.30, na residência oficial do chefe do governo, surge na sequência do "contínuo aumento" de novos casos diários de infecção e pela necessidade de "reforçar a sensibilização dos cidadãos para a adopção de medidas de prevenção e de segurança contra a covid-19".

Do gabinete de crise, que se reuniu pela última vez em 29 de Junho, em São Bento, fazem parte os ministros Pedro Siza Vieira (Economia e da Transição Digital), Augusto Santos Silva (Negócios Estrangeiros), Mariana Vieira da Silva (Presidência), João Leão (Finanças), João Gomes Cravinho (Defesa), Eduardo Cabrita (Administração Interna), Ana Mendes Godinho (Trabalho, Solidariedade e Segurança Social), Tiago Brandão Rodrigues (Educação), Marta Temido (Saúde) e Pedro Nuno Santos (Infraestruturas e Habitação).

O Presidente da República já tinha prometido que queria falar com o PM sobre a questão benfiquista. A reunião entre os dois começou pouco depois das 18.00 - logo a seguir à tomada de posse dos novos secretários de Estado. Prolongou-se durante mais de uma hora, terminando, como habitualmente, sem declarações no fim. Como é norma sempre que vai a Belém para estas reuniões semanais, Costa entrou e saiu do palácio por uma porta lateral, fora portanto dos olhares dos jornalistas. Durante o dia todo, aliás, não fez uma única declaração pública.

O facto, porém, é que quando Costa chegou a Belém já não era da comissão de honra de Vieira - este havia-o "despedido". Não se sabe se o assunto chegou ou não a ser abordado com o Presidente. O que se sabe é que a pandemia está a crescer e terão de ser decretadas novas medidas - por exemplo: uma delegada de saúde pediu que o próximo 13 de Outubro em Fátima se faça sem peregrinos, como foi o 13 de Maio. Dificilmente, portanto, deixou de ser o tema principal da conversa.