A política portuguesa
"moderna" vive quase só de incidentes medíocres, de tagarelice
parola, de zangas comadreiras e de "protagonistas" sem história. Em
25 de Novembro de 1975, a coragem moral, política e física de alguns dos
melhores de nós - coisa de carácter que é uma qualidade com tendência a
perder-se - evitou uma "guerra civil" original, um híbrido a meio
caminho entre um festival de folclore e um tiroteio a sério. Naquele dia,
quando a aventura militar se declarou, de mãos dadas com a extrema-esquerda e a
complacência estratégica do dr. Cunhal - que se retirou a conselho de Costa
Gomes e mandou evacuar os "civis" das cercanias dos quartéis -,
emergiu um homem desconhecido, de ar duro e sombrio, com os olhos escondidos
atrás de uns óculos escuros. Liderou com sucesso o "contra-golpe" e
impôs-se, de seguida, como chefe incontestado de um exército desfeito, primeiro
pela guerra, depois pelas brincadeiras do PREC. Ramalho Eanes foi porventura a
criatura que mais poder concentrou nas suas mãos depois da
"revolução". Eleito presidente, em 1976, uns escassos sete meses após
a sua aparição na conturbada política nacional, era igualmente CEMGFA,
comandante supremo e presidente do Conselho da Revolução.
Nada disso impediu, antes
pelo contrário, que voltasse a disciplina à tropa e que a democracia se
institucionalizasse. Na noite de 25 para 26 de Novembro de 1975, na Amadora, o
poder representado pelo Presidente Costa Gomes e pelo Primeiro-Ministro
Pinheiro de Azevedo agradeceu publicamente a Eanes e a Jaime Neves, comandante
do Regimento de Comandos, aquele gesto refundador e patriótico. Orgulhemo-nos,
pois, destes homens sem os quais nada teria sido possível. por João Gonçalves no Portugal dos Pequeninos