Orçamento
Vital Moreira
O
País vive suspenso da questão de saber se o orçamento é inconstitucional ou
não. O caso não é para menos. Ninguém pode antecipar o que o Tribunal vai
decidir no seu sempre prudente juízo.
Entretanto,
não compartilho pessoalmente dos argumentos que
têm sido enunciados para defender a inconstitucionalidade -- e é a
inconstitucionalidade (e não a constitucionalidade) que é preciso demonstrar de
forma convincente, pois em caso de dúvida ela é dada como "não
provada".
Primeiro,
o orçamento deste ano é bem menos desequilibrado na repartição dos sacrifícios
(entre sector público e privado e entre rendimentos do trabalho e do capital)
do que o do ano passado. Segundo, nem a redução dos escalões de IRS nem a sobretaxa
uniforme sobre o IRS alteram a progressividade do imposto (certamente menor do
que antes, mas ainda assim progressividade). Terceiro, não me impressiona o
"enorme aumento" da carga fiscal -- a Constituição não proíbe
impostos elevados!
É
certo que se mantém, embora reduzido a metade, um corte adicional nos
rendimentos dos funcionários públicos em relação aos trabalhadores do setor
privado. Mas parece-me mais do que razoável que em situações destas quem tem
uma situação comparativamente mais favorável (menor horário de trabalho,
maiores remunerações em média, mais segurança no emprego) e seja remunerado
pelo Estado, seja chamado a contribuir mais para os encargos públicos em situações excepcionais (e é disso que se
trata!).
Resta
a sobretaxa sobre as pensões (excluídas as mais baixas), que me parece o único ponto constitucionalmente problemático.
Ainda assim, o ponto não me parece suficientemente forte para sustentar um
juízo de inconstitucionalidade. Também as pensões acima da média beneficiam de
uma situação relativamente vantajosa: por um lado, na generalidade dos casos,
os descontos feitos ao longo da vida contributiva não dariam para cobrir a
maior parte das pensões; segundo, ao contrário dos trabalhadores no activo,
cujos descontos financiam as pensões actuais, os reformados não correm o risco
de ficar sem rendimentos, por causa de despedimento.
No
meio de tudo, o elo mais fraco na actual
situação de crise não são os funcionários públicos nem reformados (ressalvadas
as pensões mais baixas) mas sim os trabalhadores do setor privado, com os
salários relativamente mais baixos, aliás a passarem por reduções nominais (o
que não sucede com os demais), e com o elevado risco de desemprego e de perda
absoluta de rendimentos.... in Causa Nossa