quinta-feira, 3 de abril de 2014

É oficial: toda a França, governo socialista incluído, virou à direita

A
vantagem de Manuel Valls, o novo primeiro- -ministro francês, é que, ao
contrário de François Hollande, não engana ninguém. É o mais sincero dos
militantes do PS francês - há uns anos sugeriu a mudança de nome do partido
tendo em conta que havia pouco "socialismo" a difundir pelo PSF na
sociedade francesa e era preciso não assustar nem mercados nem capitalistas.
Martine Aubry, antiga presidente do PSF, respondeu-lhe que se não se sentisse
bem no partido o abandonasse, mas era impossível banir o socialismo do nome do
partido. Valls ficou e agora está a colher os frutos de ser o mais à direita
dos ministros de Hollande e de ter ocupado o topo das sondagens enquanto a
popularidade do presidente agonizava.
Manuel
Valls é filho de emigrantes - nasceu em Barcelona durante as férias dos pais,
que trabalhavam em França, porque o pai queria que o filho nascesse catalão -
mas tem uma linguagem contra os imigrantes mais dura que a de Sarkozy. Aliás,
enquanto ministro do Interior expulsou de França mais comunidades ciganas que
Sarkozy. Foi a este duro da direita do PSF - a quem a "Economist" já
chamou "o Sarkozy socialista" - que Hollande decidiu entregar o
governo depois do cataclismo de domingo passado, quando viu a direita ganhar as
eleições e a extrema-direita de Marine Le Pen obter um resultado histórico.
Querem a direita? Então tomem lá, decidiu Hollande. E desde segunda-feira é
oficial: toda a França, incluindo o governo socialista - de que já se
auto-excluíram os Verdes - virou totalmente à direita. Hollande e todo o seu
projecto de acabar com a austeridade, etc., suicidaram-se. Não existe nenhuma
aldeia gaulesa capaz de resistir ao consenso invasor de Bruxelas, Berlim e
Frankfurt, quando todos os partidos socialistas e social-democratas são
cúmplices da via única traçada que nos promete austeridade para o resto das
nossas vidas. Infelizmente, até agora também não surgiu uma alternativa
consistente vinda de outros lados.


A
nomeação de Valls - impossível de dissociar do choque provocado entre os
socialistas pela ascensão de Marine Le Pen - é a assunção desta tragédia. Claro
que Valls é mediático, é especialista em política de comunicação e tem aquilo a
que se chama "boa imprensa". Mas a entrega do Palácio de Matignon a
um duro da direita do partido que não gosta do nome "socialista"
simboliza o suicídio de François Hollande e, de certa maneira, a capitulação de
toda a social-democracia europeia.