terça-feira, 29 de dezembro de 2009

uma entrevista a não perder

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O ministro (das Finanças) português não tem poder. Mandam-no calar. O ministro das Finanças normalmente é considerado o "Senhor Não". E aqui não é assim porque ninguém liga nenhuma. Portanto, das duas uma: ou o primeiro-ministro também tem perícia financeira - esse era certamente o caso quando eu estive no governo -, ou então não tem, e o poder do ministro das Finanças é mau. Extraordinário é que já ouvi respostas como: "Não, é que já houve aqui uma ditadura, até parece que era de um ministro das Finanças." É realmente uma confusão histórica monumental. Porque um ministro das Finanças com poder é uma garantia para o contribuinte. Quando o ministro não tem poder cria-se uma situação do género: "Alguém que pague, depois logo se vê." Mas não há alguém cuja cara seja: "Eu sou aliado dos contribuintes."
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O actual governador (do BdP) é um homem com interesse pela universidade. Teve uma carreira partidária importante e depois teve uma experiência bancária que foi decisiva, porque lhe deu o que o académico não tem: o real time. Teve isto tudo. E mesmo assim apanhou o tsunami da supervisão financeira, que não teve consequências más, mas que, como com outros banqueiros centrais, o levou a dizer : "Não me tinham falado sobre isto." Não vejo tanto a questão da cor política, porque o Banco de Portugal ajudou governos que não eram socialistas. É quando se tem de substituir a pessoa, qual é o universo para o qual se olha. Se o universo forem só os boys - ou as girls, não se vê porque não podemos ter uma governadora (há agora uns testes feitos em Cambridge, de neurobiologia, que mostram que o sentido do risco pode ser maior nos homens, mas o sucesso financeiro muitas vezes é maior quando se consegue combinar o sentido do risco com o cuidado feminino) -, diria que a questão da cor é importante quando leva a que nem sequer se considerem outras pessoas. A independência sem competência não é credível. E a competência não traz independência. Não se olha suficientemente para o universo, e estou convencido de que há pessoas próximas do PS que poderiam ambicionar o lugar de governador e até gostariam.
Jorge Braga de Macedo ao jornal “i”