No princípio, o reino de Portugal começou por construir o caminho-de-ferro de Lisboa a Elvas, numa linha onde algures num ponto chamado Entroncamento partiria um ramal para o Porto. E assim foi. O comboio chegou primeiro a Badajoz em 1863, mas de Lisboa ao Porto só viria a haver comboios directos em 1877 com a inauguração da Ponte de Maria Pia.
A prioridade foi sempre a de ligar os portos a Espanha e por isso tudo se fez para romper as linhas em direcção à fronteira. Enquanto a Linha do Norte foi construída aos soluços, a da Beira Alta (1882), que ligaria Figueira da Foz a Vilar Formoso, foi feita em quatro anos (um tempo recorde para a época) e pôs o Porto em polvorosa a clamar por uma linha directa a Espanha pelo vale do Douro. Fez-se então a linha do Porto a Barca de Alva (1887), após um investimento brutal que levaria a praça financeira da Invicta à falência, ficando os seus bancos impedidos de cunhar moeda - um caso que ficou para a História como a "Salamancada".
Mais a sul, em 1880 era inaugurado o ramal de Cáceres (Torre das Vargens a Beirã/Marvão) que constituía um bom atalho para Madrid. O objectivo era chegar aos fosfatos da zona de Cáceres, que seriam escoados para o Porto de Lisboa, mas a nova linha revelou-se outro fiasco porque o filão esgotou rapidamente. Além das amortizações de um investimento inútil, a Real Companhia dos Caminhos-de-Ferro assumiu então encargos que a obrigaram a pagar as obras de conservação da estação madrilena de Delícias.
Enquanto isto, Espanha construía um eixo ferroviário desde Vigo até Ayamonte que contornava a fronteira portuguesa. Era a "cintura de ferro", como ficou conhecida. De resto, em Badajoz e em Vilar Formoso, durante vários anos, havia linha desde Lisboa, mas não havia continuação para Madrid porque os espanhóis tardaram em ligar-se às fronteiras.
Portugal construiu, pois, a sua rede ao sabor dos interesses espanhóis. E também foram eles os primeiros a fechar as poucas ligações à fronteira quando nos finais do século XX se tornou moda encerrar linhas de caminho-de-ferro: desmantelaram a linha de Huelva a Ayamonte e foram os primeiros a fechar La Fregeneda quando o comboio ainda apitava em Barca de Alva.
Mais recentemente, em 1998, a Refer inaugura a electrificação da Linha da Beira Alta até Vilar Formoso. Mas a Espanha, apesar dos compromissos assumidos na cimeira da Figueira da Foz em 2003 e de já ter um projecto terminado, nunca avançou com as obras de electrificação até à fronteira lusa.
E quando nos alvores do século XXI se começa a falar no TGV, Portugal começou por querer fazer uma linha Lisboa-Porto-Madrid (T deitado) para se opor ao centralismo do país vizinho. Mas acabaria por se conformar com uma linha directa de Lisboa a Madrid. Com prioridade para a primeira, claro. Tal como no século XIX.
Ferreira Leite, se for eleita, diz que não senhor. Explica que as motivações são financeiras. Mas sabe-se lá se não quererá acertar contas com a História. Por Carlos Cipriano in Público - A vingança de Manuela Ferreira Leite
A prioridade foi sempre a de ligar os portos a Espanha e por isso tudo se fez para romper as linhas em direcção à fronteira. Enquanto a Linha do Norte foi construída aos soluços, a da Beira Alta (1882), que ligaria Figueira da Foz a Vilar Formoso, foi feita em quatro anos (um tempo recorde para a época) e pôs o Porto em polvorosa a clamar por uma linha directa a Espanha pelo vale do Douro. Fez-se então a linha do Porto a Barca de Alva (1887), após um investimento brutal que levaria a praça financeira da Invicta à falência, ficando os seus bancos impedidos de cunhar moeda - um caso que ficou para a História como a "Salamancada".
Mais a sul, em 1880 era inaugurado o ramal de Cáceres (Torre das Vargens a Beirã/Marvão) que constituía um bom atalho para Madrid. O objectivo era chegar aos fosfatos da zona de Cáceres, que seriam escoados para o Porto de Lisboa, mas a nova linha revelou-se outro fiasco porque o filão esgotou rapidamente. Além das amortizações de um investimento inútil, a Real Companhia dos Caminhos-de-Ferro assumiu então encargos que a obrigaram a pagar as obras de conservação da estação madrilena de Delícias.
Enquanto isto, Espanha construía um eixo ferroviário desde Vigo até Ayamonte que contornava a fronteira portuguesa. Era a "cintura de ferro", como ficou conhecida. De resto, em Badajoz e em Vilar Formoso, durante vários anos, havia linha desde Lisboa, mas não havia continuação para Madrid porque os espanhóis tardaram em ligar-se às fronteiras.
Portugal construiu, pois, a sua rede ao sabor dos interesses espanhóis. E também foram eles os primeiros a fechar as poucas ligações à fronteira quando nos finais do século XX se tornou moda encerrar linhas de caminho-de-ferro: desmantelaram a linha de Huelva a Ayamonte e foram os primeiros a fechar La Fregeneda quando o comboio ainda apitava em Barca de Alva.
Mais recentemente, em 1998, a Refer inaugura a electrificação da Linha da Beira Alta até Vilar Formoso. Mas a Espanha, apesar dos compromissos assumidos na cimeira da Figueira da Foz em 2003 e de já ter um projecto terminado, nunca avançou com as obras de electrificação até à fronteira lusa.
E quando nos alvores do século XXI se começa a falar no TGV, Portugal começou por querer fazer uma linha Lisboa-Porto-Madrid (T deitado) para se opor ao centralismo do país vizinho. Mas acabaria por se conformar com uma linha directa de Lisboa a Madrid. Com prioridade para a primeira, claro. Tal como no século XIX.
Ferreira Leite, se for eleita, diz que não senhor. Explica que as motivações são financeiras. Mas sabe-se lá se não quererá acertar contas com a História. Por Carlos Cipriano in Público - A vingança de Manuela Ferreira Leite